Lendo Poesias

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Lendo Poesias

...???!!!...

 

... em um momento, a vida era aquele vermelho escarlate pingando entre meus dentes, misturando-se com o amarelo reflexo de meus óculos espelhados no sol de outubro, caídos no chão. era aquele cheiro de égua sugando o ar do lugar. era os pelos pretos da graúna consumindo a luz do dia, consumindo a luz do meu dia!... eu sou a alma que, sem lágrimas nos olhos, sentada agora à beira do túmulo, impávida espera o carniçar de seu corpo. a alma que agora sente o formigar dos bichos devorando, destroçando sua carne e que, sabe, não vai se afastar depois que a última vela apagar; depois que a última ladainha calar; depois que a última visita sair. Mais ninguém me ouvirá lamentar. Mais ninguém ouvirá meu gargalhar...

 CAVEIRA

desilusão

 

Cansei. 

A caminhada tem sido longa e árida.

Não vejo onde chegar.

No que acreditei, naquilo por que lutei... esfriaram - não acredito mais.

As pessoas a quem um dia amei, os sonhos que sonhei... sangraram – não os tenho mais.

Confesso: estou cansado.

Cansado de lutar comigo mesmo contra mim mesmo. 

São muitos passos perdidos rumo ao nada.

Estou vencido por minhas tentativas frustradas de querer ser.

Ser feliz, conviver, sorrir: fracassei.

Mesmo raiva, consigo mais ter.

Nem amor: amorfo, isolado, sombrio – vivo assim.

Vivo?! Mesmo?!

O mundo é assim mesmo!?

Meu mundo é assim mesmo!

caveira

horas de dor

 

Dormir sem precisar acordar

Acordar sem rumar para onde ir

Ir sem ter um lugar pra chegar

Chegar sem ter razão pra fugir

 

Tatear tentando algo pegar

Pegar tentando algo sentir

Sentir tentando não chorar

Chorar tentando não implodir

 

Falar e quase nada sorrir

Sorrir e quase nada sofrer

Sofrer e quase nada rugir

 

Ouvir a dor e mudo ceder

Ceder à dor e surdo mentir

Mentir sofrer chorar e sorrir 

 

anas 

 

Ana é nome de mulher

Apoliana também é

Poliana são várias Anas

Analice é verdadeira

Anabela está sempre bela

Analice fala a verdade

Anabárbara se faz estranha

Anaclara brilha no céu

Ana Cristina ora-pro-nobis

Josiana Lidiana Mariana...

São tantas Anas na vida!

São mulheres!

 

vitam aeternam 

 

Sem pai sem mãe a quem reclamar...

sem um ombro onde a tristeza chorar...

sem mesmo alguém para dizer que está triste...

que a dor está mais doída...  

dizer que a saudade corrói sua alma inteira...

e que nenhuma autoestima o leva a caminhar.

 

Sem referência de passado e esquecido pelos amigos!

Abandonado, vê agora sua vida ser apagada!

emparedado entre quatro paredes, olha a vida pela janela

- lá fora os carros passando, as pessoas andando –

solitárias, em grupos; muito apressadas, sem muita pressa;

um cavalo pastando com sua carroça ao lado.

 

Sem assunto o que falar, alguém para conversar, óculos sobre o nariz, lê um livro:

é refém das lembranças de uma vida que nem sabe ser a sua - deseja ardentemente morrer!

 

desanimus

 

cada um dia dos anos que passam:

- manhãs, tardes e noites,

dessa vinha des-engraçada;

cada um rumando só ao seu fim:

cada vez mais estranho se torna

o significado de ser-humano,

o significado de com-viver.

 

viver a in-capacidade de compreender o homem;

viver a i-responsabilidade nas relações sociais;

viver o a-caso da vida espiritual;

viver o caso da vida material:

- tamanha a in-utilidade da vida terrena.

noturno

 

taça quebrada

resto de bebida derramada

cabeças embriagadas

de sonhos esvaziadas

o fútil-extraordinário

 

o irreal digladia-se com o real

dor solução podridão

uma taça quebrada na mão

um corpo que gira no ar

uma cabeça que rola no chão

 

medo grito agitação

remorso dor consolação

 

a história de um brinde

a agonia de uma idéia

a dificuldade de uma palavra

o grito preso de desculpas

a negação do ouvir

a exclamação do falar

a expressão do impor

a expressão do amar

a afirmação do odiar

 

prisioneiro

 

Só agora,

na cela onde vive,

lembrou das regras

da Igreja em que Nasceu.

 

Sem uma cama ou rede

pra deitar,

os pensamentos

o estão a flagelar.

 

Seu ato contra a vida

a relembrar:

só a Bíblia

agora pode o salvar.

 

Quer morrer, sofrer

pra se salvar,

mas só Deus

agora pode o ajudar.

 

africanitude

 

negro

como são belos os negros

cabelos de um negro

que negro que tu és?

 

negra

teus seios são duas rosas

escravas do amor

vermelho amor de mulher

 

negro

no céu azul-anil rosa arco-íris

o sol brilha só pra ti!

brilha também para ti

negro?

                                                                               caveira

 

... bateram e baniram

batista

batizado em belém:

blem! blem! blem!

... como antigamente,

o corpo

nu e desprotegido

vai ao pelourinho

morrer com fiel

estupidez:

... lutando pela luta

legal da legítima

liberdade!

                                                                              caveira

medo

 

um risco cortante no céu

um leão rugindo furioso

tudo turvo

 

luzes se ascendendo

homens se escondendo

vermes nos confins se corroendo...

 

um novo risco cortante no céu

um leão rugindo outra vez

treme a terra

soluço

                          ovelhinhas branquinhas de medo

                          soluçam Lamentos vãos

                                   gotAs

                                   d’áGua

                                        Risonhas

                                      frIas

                                       Malandras

                          assassinAs

                                       Sonhadoras

transbordam rios

transbordam sonhos

                                       a natureza se renova outra vez

olho da terra

 

 vejo homem

 

pensamento

ausência

verão

vermelhão

 

vejo animal

 

o boi

a boca

a seca

a dor

o rancor

a exploração

 

sopra o vento

arruina

 

o ar

a água

o chão

 

explode o ódio

 

a pergunta

a água

a comida

o retirante

o velho

 

há morte

há seca

há solidão

ha teima

há morte

 

ser-homem

ser-ninguém

 

peixe

 

Peixe escamado

do rio parnaíba:

peixe que nada

pra baixo e pra riba,

peixe danado

que morde a isca

– é o peixe escamado

do rio parnaíba!

Peixe que canta

que nem agogô,

que dá dor de cabeça

em seu pescador!

Peixe valente

que briga com gente

– é o peixe escamado

do rio parnaíba!

A escama do peixe,

dura que nem armadura,

o anzol toca nela

mas nunca segura.

Se botam a rede,

ele salta, ele pula,

não há quem segure

esse peixe vadio:

peixe escamado

do rio Parnaíba!

página policial

 

O homem desce do ônibus

Faz o “pelo sinal”

Suplica a Deus:

Quer retornar para os seus!

 

O Sol ainda não brilha no alto

Os passos têm que se apressar

Bancas de revista

Mostram o filme que vai passar:

 

Criminosos Invadem Casa e Matam Menina

Universitário É Morto com Dois Tiros

Dupla Faz Arrastão em Casas da Zona Norte

Trio Faz Arrastão em Aniversário Infantil

 

Exceção

 

Polícia Prende 41 Comprimidos de Ecstasy

Homem Vai à Polícia e Confessa Atropelamento

 

A prisão

 

Mulher Morre na Frente dos Filhos

Bebedeira Termina com Tiros

 

Exceção

 

Polícia Prende mais uma Tonelada de Maconha

 

A prisão

 

Droga é o pivô de crimes

É a ditadura da droga

É a paz que admitimos

 

 quo vadis

 

Companheiro vidandante,

que à sombra da cajarana

se permitiu relaxar...

tens mesmo que te agarrares

à esta vida besta que levas?!

 

Pensa, amigo:

 

quantas bocas vis mentirosas

a teu respeito

verdades têm elas dito...

 

quantas cabeças acéfalas

sobre a tua vida

teorias têm elas forjado...

 

quantas mãos trêmulas tateantes

para a tua existência

leis impossíveis têm elas escrito...

 

Mas... e tu,

camarada vidandante, 

fez e vais continuar fazendo nada?!

 

Que tu tens feito por ti mesmo,

tens te questionado, velho colega ?!

 

Por que tu permites

que bocas outras

sejam teus interlocutores?

 

Por que tu te omites,

por que te deixas anular

diante dessas cabeças vazias?!

 

Por que tu aceitas cabisbaixo

que mãos inseguras

te direcionem os caminhos?!

 

Por que, companheiro...  por quê?!

 

Companheiro vidandante,

aí à sombra há tempos relaxado,

já sem força e alquebrado,

reconforta-te a mente a certeza

‘alea jacta est!"

 

Aqueles sonhos dourados,

no princípio emergentes,

no passar do tempo soterrados,

não se tornaram realidade!

 

Sem reação alguma

em causa própria a esboçar,

assistes ao trabalho infame

do tempo transformando o espaço;

da realidade transformando o sonho!

 

Companheiro vidandante,

da vida  o que ainda esperas:

ouro, dinheiro, poder?...

glória, fama, amor?...

 

Já não acreditas mais,

já não gritas mais...

a ninguém agrides mais,

já não sentes mais,

já não sonhas mais!

 

Sobre as próprias pernas magras,

usando as próprias mãos calejadas,

carregando a própria barriga quebrada:

ouves o estalido do cérebro...

agonizas triste e silencioso.

 

O tempo amassou teu rosto,

mapa da vida sonhada,

retrato da vida levada.

 

Nevou em tua cabeça,

choveu em teus olhos,

desertificou os teus lábios.

 

A luz dos olhos esvaiu-se,

a noite chegou de mansinho,

o silêncio parece inevitável!...

 

Vidandante, meu amigo,

sai do pó, bate a poeira,

arregala bre o olho... arreganha o ouvido:

 

no céu o cometa passou,

no estábulo o burro relinchou,

no leito a criança chorou,

a mãe sorriu!... o dia novo nasceu!...

 

Ergue teu corpo,

apruma teu cajado,

reascende o fogo de tua vontade,

recomeça... luta!

 

Mata o verme

que a tua alma apodrece,

reativa teu cérebro,

pensa!

 

Vidandante vai adiante...

vai em frente,

segue o cometa brilhante;

faz o teu caminho no rastro,

cumpre o teu destino!

 

Vidandante vem andando

companheiro amigo,

segue comigo, olha o rio...

ao senhor meu deus

 

            I

Senhor Deus,

poderoso Arquiteto do Universo:

não poderia eu agora nestas difíceis horas

rogar a Vós,

mesmo em Vossa infinita misericórdia,

que volteis Vossos santos olhos para mim,

pobre infeliz pecador,

pois sei que nada mais sou neste mundo

que um a mais dos milhares de outros

que como eu,

amontoados pelos quatro cantos da Terra,

desviaram-se do caminho

da bondade e da compreensão

por Vós para todos traçados.

 

           II

Meu Senhor,

envergonha-me,

e envergonha a humanidade,

o fato de que,

por gente como eu,

desgraçado e ignorante

de Vosso santo ofício na Terra,

Vós derramastes Vosso santo sangue na cruz.

 

            III

Senhor Meu deus,

hoje, mais que qualquer outra época,

quando o tempo bate forte em minhas faces,

esbranquiçando meus cabelos,

vejo com clareza

que em minha vidinha egoísta

sempre encarnei o mau ladrão,

aquele que, crucificado no alto do Gólgota,

esqueceu em nome de quem Vós sofríeis

para pensar somente em si próprio.

 

           IV

Senhor Deus,

mesmo sabendo-me insolente,

flagelado pela dor da ignorância,

venho queixar-me a Vós,

que a todos ouvis,

que a todos perdoais,

que a todos levais a esperança

da vida eterna,

mas não se faça a minha

e sim a Vossa vontade.

 

         V

Meu Senhor,

venho em Vossa santa presença

humildemente confessar

minhas fraquezas,

minhas debilidades

em razão do sofrimento

que a vida terrena me tem imposto.

sou fraco

e rogo teu perdão

mesmo sabendo que alguém,

em algum outro lugar,

sofre mais que eu.

as dificuldades da vida material

têm-me imposto sentimentos como este,

mesquinhos e egoístas,

e outros como o ódio e a inveja,

que me corroem a alma.

 

            VI

Senhor Meu Deus,

como pode a fé vencer a desconfiança,

se a Vós rogamos e não somo entendidos?

como pode o amor vencer o ódio,

se o mundo nos olha com desprezo?

como pode a fraternidade vencer a ganância,

se sofremos os horrores da fome?

como pode o despojamento vencer a inveja,

se a vida nos faz tão desgraçados?

 

             VII

Senhor Nosso Deus,

o teu povo chora e sofre,

todos rogamos a Vós!

o sermão das cidades

 

Bem-aventurados os sem-teto,

         Que brigam por um lugar sem descanso:

         Da sua briga depende a dignidade do homem.

Bem-aventurados os sem-terra,

         Que pelejam contra a violência dos latifúndios:

         Da sua existência depende a existência da raça humana.

Bem-aventurados os assalariados,

         Que se indispõem contra a ignorância dos patrões:

         Da sua indisposição depende o respeito a todo cidadão.

Bem-aventurados os pobres e oprimidos,

        Que conspiram contra seus opressores:

        Da sua conspiração depende a liberdade do homem.

Bem-aventurados os menores abandonados,

        Que se revoltam contra a violência vivida nas ruas:

        Da sua revolta depende o futuro da família.

Bem-aventurados os que choram pelo direito de nascer,

        Porque suas lágrimas hão de tocar os corações de pedras

        E transformar o ímpio em homem de boa vontade.

Bem-aventurados os guerreiros das favelas e guetos,

        Que lutam na batalha contra a fome, a miséria e a pobreza:

        Da sua vitória surgirá o significado da palavra felicidade.

Bem-aventurados os que cantam a paz no Universo,

        Porque do seu canto nascerá o novo raio de sol,

        Aquele que iluminará o pensamento do novo homem.

Bem-aventurados os que proclamam o amor como o bem maior,

        Porque no seu amor estará a lembrança de quem somos,

        Dom amor renascerá o homem livre.

Bem-aventurados os enfermos que agonizam,

        Abandonados nos leitos dos hospitais,

        Porque na agonia deles  renova-se a fé no criador.

Bem-aventurados os que sofrem com o preconceito,

        Negros, índios, pobres e homossexuais:

        A dor que sofrem mostram a antítese do ser-humano.

Bem-aventuradas as mulheres desamparadas,

        Que sofrem a violência de seus parceiros:

        Porque o sofrimento delas expia os pecados do homem.

Vós sois, senhores que ouvis estas palavras,

os cidadãos do futuro iminente,

e de vós depende um mundo mais justo e fraterno.

Vós sois sujeitos de vossa própria história;

se abdicais dessa sagrada obrigação,

se permitindo transformar em objetos,

pingentes das vontades dos outros...

de nada mais servireis senão para serdes usados,

pisoteados e depois atirados para fora do barco.

Regozijai-vos e exaltai a vida,

fazendo assim serão grandes as chances

de um dia vós serdes humanos.

Pois assim escrevem os doutores:

sociólogos, filósofos, antropólogos...

Não vos esqueçais que sois indivíduos pensantes,

sem vós cidade alguma pode ser edificada,

seja na praia, no campo ou mesmo no monte.

Porque o indivíduo pensante, tornado cidadão,

o responsável pela malha de relações sociais e humanas,

pilares da existência no mundo

– sendo bom ou ruim, o homem faz o  mundo bom ou ruim.

Não penseis vós que agindo assim

infringireis as leis dos juízes.

Em verdade, justiça e legalidade

podem tomar caminhos diferentes.

Todo aquele, pois, que agir legalmente

com seu semelhante, mas não com justiça,

será considerado um verme em sua própria sociedade;

e todo aquele que para com seu irmão

agir com justiça, mesmo que de forma ilegal,

será respeitado e recompensado.

Nem sempre a legalidade faz a justiça.

o sermão do retorno

 

Companheiro professor,

Vós, que de mais uma árdua batalha

Às atividades de sala de aula

Hoje retornais;

Vós, que em prol da vida e da dignidade

Tão bem nas ruas e praças

Ontem pelejastes;

Vós, que nessa luta in-glória

Consciente ou inconsciente

De peito aberto mergulhastes;

Vós, que penosamente às costas

Pelos caminhos da ignorância

A cruz do saber carregais;

Vós, que em muitos momentos de fraqueza

Na fadiga da cruel batalha

De vosso Deus vos afastastes...

 

Rejubilai-vos hoje, meus amigos!

Fazei isso por vedes que de volta

Sãos e salvos do fio da guilhotina

Pelas mãos de vosso Deus vós estais!

 

Trilhando as espinhosas veredas do ensinar,

Não deixeis vós que agora os parcos salários,

A vós injustamente pagãos,

E que a mãos do governo da iniquidade,

Atroz, vil e sanguinária,

Em vosso honroso trabalho interfiram.

 

Lembrai vós, companheiros profissionais,

Que vós sois a luz que ilumina

O caminho em trevas dos milhões de analfabetos

Abandonados errantes dessa Babel desgovernada.

 

Hoje, mais que em qualquer outro tempo,

Quando o filho de José

De vós, pobres errantes, se despede

E forte sobe para aos seus

No “Senatus” se juntar,

Sede fortes e bravos, meus amigos,

Fortes e bravos como vosso Pai que está no céu

É bravo!

 

Pensai e refleti vós nesse momento que

Podem mesmo de vós arrancar o braço

Com o qual vós tateais no quadro de giz,

Único material disponível na escola;

Podem mesmo de vós tirar os velhos alfarrábios,

Baseados nos quais vós rabiscais o “script”

Da aula que a vossos apóstolos ministrais;

Podem mesmo de tirar a sala de aula,

Onde vós com honra exerceis vosso ofício,

Mesmo que em condições inadequadas;

Podem mesmo de vós surrupiar aqueles parcos salários,

Com os quais vós sustentais vosso rebentos,

Ainda que com apenas sobras de comida...

 

Mas jamais, meu amigo,

Jamais permitais vós vos solapar

A hora, a dignidade e a vontade de combater

As iniquidades, os desmantelos,

As diferenças sociais preconceituosas

Que muitos aviltam o caráter do povo livre,

Que por vossa luz divina anseia.

Outras árduas batalhas hão de vir;

Outras cabeças inocentes pelo chão sujo

Das ruas e das praças hão de rolar;

Outros ralos salários de vós hão de roubar...

E vós, companheiro de infortúnio,

Vós que edificastes vossas ações

Sobre a rocha da verdade e do amor,

Vós permanecereis in-tactus,

Vós e vossa consciência,

Pilar de vossas atitudes solidárias.

Vós sois, companheiros professores,

A tocha que o Homem carrega

História a dentro;

O sal que tempera a vida

Na sociedade em trevas!

 

deus não gosta de mim!

 

Você diz para eu me enxergar,

fala que sou um ninguém,

que quero exclusividade,

que Deus é grande,

que Deus é grandioso,

que Deus é de todos!...

que exclusividade, não vai me dar.

Como eu quero, não vai me olhar.

E não vai mesmo, nunca vai me olhar.

 

 Deus não gosta de mim!

 

Fez-me um cara feio, em tudo:

pequeno, amargurado e amargo.

Sem coração para amar.

Achou pouco, me aleijou:

o corpo, a alma, as vontades.

Arrancou-me a ilusão do futuro,

apagou o meu passado.

Tirou minha dignidade,

Transformou-me num entulho.

 

 Deus não gosta de mim!

 

Deus existe:

É poderoso!

É onipresente!

É onipotente!

Criador do universo!

Eu existo:

Sou humano!

Vejo Deus,

Deus me vê.

 

Deus só não gosta de mim!

 

minha mãe

 

tu te foste

e cedo me deixaste

Saudades...

tu te foste para longe

para bem longe

para a terra do nunca mais...

viveste e cumpriste  rito

princípio meio e fim

nasceste como nascem

as plantas nativas do agreste

cresceste entre rosas

vivendo a vida

com espinhos te misturaste

- eles te cobriram de vida

-eles te cobriram de morte

o tempo passou... passou...

e passou?

tuas lembranças

elas continuam

povoam meus sonhos

espantando meus pesadelos

por ti ainda choro

como chora a mãe

que o filho abortou.

meu pai

 

o tempo bateu em teu rosto

tu envelheceste

teu semblante se modificou

tua cabeça não

- do meu mundo tu te afastaste

de um tempo mais passado

tu viveste um tempo mais presente

- como te compreender?..

não há censuras

há agradecimentos

- as ideias do teu tempo

no meu mundo

não me faz bem

em meu corpo

tuas mãos

jamais usaram uma chibata

como fizeram os de teu tempo

contigo

- para quê?!

tu perguntavas

de tudo foste:

mentiroso

verdadeiro

mau

bondoso

vitorioso!...

mas antes de tudo

foste Homem

meus espelhos

meu pai.

minha irmã

 

 

xingaram-na impura

cuspiram-lhe o rosto

arrancaram-lhe as vestes

silenciaram sua fala

– não modificaram seu pensar

era a ovelha negra

seria julgada

seria condenada

seria queimada

– jamais foi esquecida

seu exemplo foi para todos

suas roupas foram para todos

seu sorriso foi para todos

– sua voz... bem, sua voz... 

nós de hoje

renascemos por ela

revivemos por ela

sofremos por ela

com ela

no coração

minha filha

 

Dorme, criança:

Em que pensas agora:

No passado...

Que passado?

No presente...

Que presente?

No futuro...

Que futuro?

Na barriga da mãe?

No mundo onde viverás?

No que tu te tornarás?

 

Se não estás pensando,

é melhor nem pensar.

Deixe o pensamento,

sob o céu azul dos sonhos, deslizar.

Deixe a fantasia te levar.

Deixe o verde te colorir.

Deixe o brilho das estrelas

teu sorrir iluminar...

Plante agora tua roseira,

construa teu jardim de esperança,

deixe-se a fantasia te levar,

o acaso tua alma libertará

faz teu coração flutuar:

enche-o com o sopro

da paz

do amor

da satisfação!...

 

animus mau

                                                                  um grito de desculpas

                                                                  a meu filho iury aleksandr

como o frio fio

da afiada navalha

o fino frio fio

da frágil razão

que do bicho

o homem separa

facilmente se rompe

se a rima é rara

e a razão não pura

mata o bicho

mata o homem

raro é o bicho

que mata o homem

rico é o homem

que mata o bicho

se a rima é pura

e a razão é rara

frio é o homem

que mata o homem!

 

 

 

                                                                                                  ( charge do caricaturista piauiense Joaquim Monteiro)